domingo, 10 de agosto de 2008

O dia do analgésico




Imagem limpída com cores altamente definidas, volume ajustado para não equivocar o momento. A televisão apresentava mais uma das suas programações factuais com a tarde de domingo. Ali, era possível identificar o quanto o tempo fica recluso, pelo menos para um expectador de um programa de tv. Tudo passa tão veloz que nem mesmo as palpebras conseguem muitas vezes acompanhar. Cansada daquela cena inofensiva de pensamento, pegou-se a imaginar o quanto a vida seria diferente sem a atenção destinada a programas dominicais desassisados.
Levantou-se e caminhou até o escritório, lá visualizou alguns livros, arrumados pela ordem de nome da obra. Uma classificação diferente e muitas vezes mais difícil da convencional – sobrenome do autor, ou ainda nome e sobrenome. Volta e meia perdia-se na escolha da obra, visto que o esquecimento é inerente aos traços pessoais da grande maioria das pessoas, porém mais presente nela. Desfilou os olhos sobre a variedade de livros que ali estavam, uns empoeirados e com traços amarelos do tempo.
O tempo passava e sua fúria começava a incomodar, não sabia mais o que fazer. Voltou até a sala, pegou o controle remoto e abaixou o volume que de ajustado, passou para desajustado naquele momento dante de ser. O televisor permaneceu ligado, apenas para satisfazer que a solidão de domingo não poderia ser maior que o silêncio.
Retornou ao escritório, agora munida do seu cigarro que ora estava entre os dedos de sua mão esquerda e ora estava no centro de sua boca. Tentou mais uma vez achar o livro, mas não lembrava de nada, parecia que as lembranças factuais tinham apagado o nome emblemático daquele livro. Se pelo menos lembrasse o nome do autor, mas isso de tão fácil, tornou-se absurdo para o momento.
Não obstante da procura, olhou para os livros da fileira próximo ao chão. Os seus mais de 1.70 poderiam ser um incomodo, mas não poderia deixar de achar o livro que tanto queria. As costas mal posicionadas estalaram, a bunda praticamente encostou nos calcanhares, pronto a posição de cocóras se consumiu. Sem muito a pensar, puxou alguns livros para o chão, entre os caidos, pegou um pela capa.
Contou até três. Um. Dois. Três! Lá estava uma página totalmente preenchida . Impressão leve, o tempo não apagou uma letra sequer, apenas algumas manchas, marcas pessoais do tempo. Mais do que estes detalhes, ali naquela página estava escrito aquilo que ela tanto precisava reler, mesmo que esta obra não fosse a que tanto desejasse. Pegou uma caneta bic de cor azul, arrancou um papel de sua agenda e começou a escrever, uma espécie de parafrase do romance – Hoje o silêncio se fez música. A música sinfonia. De sinfonia em sinfonia a textura do momento mostrou a vida.
Assim, a tarde de domingo deixou de ser equivocada em programas de televisão. O pensamento singelo e prazeroso da leitura daquela página iriam perdurar para o sempre que quisesse manifestar-se.
O nome do autor não reapareceu em sua memória. No momento a procura por um analgésico caso não encontrasse incomodaria mais.